Alguns te enchem de rótulos, " nossa, que coragem", " é louca", " é, essa aí ta se dando bem", "claro, teve tanta ajuda".
Bom, toda foto tem dois lados. Tem o lado da perspectiva de quem está vendo-as, e tem o outro lado, o lado que não é retratado, o lado que é só seu, o verdadeiro lado do que é morar fora. Porque, bem diz aquela música, " o que você ganha ou perde, ninguém precisa saber". E, eu sei bem que mesmo que as fotos foquem os momentos fascinantes e de glamour, como eu lí em um outro blog hoje, esses momentos estão reservados para poucos momentos e acontecimentos.
É mudança total de vida, de rotina, é sensação de desamparo, é o próprio desamparo, é falta de dinheiro, é desespero, é oração, é força tirada não sei de onde, é sufoco.
A pessoa que decide fazer as malas e morar em outro país tem conhecimento de todos as dificuldades e sente também o mesmo medo daquele que pensa em vim, mas não vem porque tem medo, a diferença é que ela sempre acha que no fim pra tudo vai se dar um jeito. E dá, porque ela sempre encontra um jeito pra resolver qualquer limitação, não tem muito apego a ideias de terceiros, abre mão de coisas materiais ou diversão com amigos e, põe nas costas asas que encontrou em algum lugar e em qualquer história que alimente sua imaginação. E quem nunca fechou os olhos com aquela " de repente, Califórnia"?, e ás vezes cantou assim:
" garota, eu vou pra Califórnia, viver a vida sobre as ondas, ver os artistas de cinema, o meu destino é ir pra lá.
Eu dou a volta, pulo o muro, mergulho no escuro, sarto de banda. Na Califórnia é diferente, irmão
É muito mais do que um sonho...."
E lá ela vai, com seu par de asas e sua vida inteira dentro de 2 malas. E a partir dalí não vai ser fácil, mas ela sabe como usar o pó pra tampar taio que já serviu muitas vezes pra curar as cassetadas, os arranhões, então vai também servir pra ensinar a viver longe de tudo que ama e seguir em frente.
Não é tão fácil como o modo que eu consigo descrever aqui, mas só pra começar, viver em outro país é não ter mais os almoços grandes de domingo feito pela mãe, e você passar por todas as etapas de um bebê que ta engatinhando e ainda vai aprender a falar para então expor seus desejos, suas opiniões, falar dos seus gostos, ouvir e compartilhar histórias do seu dia.
É tudo diferente! Tudo! As pessoas vivem diferente, os horários das refeições são diferentes, as casas são diferentes, as ruas diferente, as comidas diferente... Muitas vezes as diferenças são tão boas e você pensa: ah, se fosse assim no meu país, ah se tivesse isso no meu país!
Mas, como falei que tudo tem seus 2 lados, o problema começa todas as vezes que a diferença traz saudades. É o abraço brasileiro, é reencontrar seu amigo de infância, é fazer a unha fiado no salão, é chegar na casa da mãe e abrir a geladeira ou pôr os pés no sofá sem cerimônia, é ouvir alguém te chamar, " vai todo mundo lá pra casa amanhã a noite só pra comer e jogar conversa fora", e não ter hora marcada pra sair de lá; é ouvir modas de viola, é alguém tocar violão ao redor da fogueira, é em noites de lua cheia ouvir as histórias de terror, do curupira, da Iara que vai sair da água e te chamar, do pai do vizinho que vira lobisomem, é tanta coisa...
E nem todo mundo aguenta isso, por isso que muitos arrumam novamente as malas e fazem o caminho de volta, porque muita gente quer construir seus sonhos ao longe, mas nem todo mundo consegue suportar o desgaste emocional de viver longe do ninho.
Você vai depender só de você. Não é fácil, mas muitos aguentam! Eu aguento!
Eu nunca fui acomodada e sempre queria mais, queria mais do que eu tinha, queria viver uma vida diferente, e o cotidiano e as atividades que eu fazia não me preenchiam mais, queria pular o degrau e chegar em outro ponto, e pra pular esse degrau eu precisava pegar o passaporte e cruzar o continente. Sim pra realizar alguns dos meus sonhos, eu precisava mudar de país, e ninguém conseguiu me fazer desistir.
Eu encontrei muita gente boa e de coração enorme, mas eu precisava ser melhor! Sim, espero que a frase não tenha passado despercebida, " ENCONTREI MUITA GENTE BOA E DE CORAÇÃO ENORME, MAS EU PRECISAVA SER MELHOR" pra me dar bem em cada oportunidade que me chegava, PRECISAVA SER MELHOR e não podia ter dó de mim mesma, nem ir devagar pra aprender o inglês, que até agora ainda é meu engatinhar de bebê. PRECISAVA SER MELHOR em todas as vezes que não via o resultado nas coisas e elas pareciam que nunca iam chegar.
E eu me sinto corajosa porque muitas vezes aqui nos Estados unidos, fiz as contabilidades de madrugada e usei o dinheiro da comida e aluguel pra pagar a escola. Fiz minhas malas e, com 100 dólares no bolso e sem falar o básico do inglês, peguei 2 aviões pra viver com estranhos no outro lado do país, e sem nem saber contar as moedas tremí com uma fila enorme atrás de mim e, tremí mais ainda diante da moça impaciente do check in. É sair de casa e se perder, e procurar o caminho de volta andando sob a neve por horas sem rumo pelas ruas a noite, e com celular descarregado!
Passei muita pressão, sentí medo, angustia, tive vontade de voltar pra casa, mas eu não tinha muito tempo pra lamentar a tristeza e não tinha ninguém pra ter dó de mim.
Não, não quero dizer que eu achava que eu era de ferro, mas sempre conseguí dar um jeito e não permitir que o fracasso do dia ditasse meu rumo pro dia seguinte.
Chorar? rum, só a mocinha que tem o intercâmbio totalmente pago pelo papai tem o luxo de deitar com ursinho de pelúcia e chorar no travesseiro. Os meus chuviscos eram talquinhos pra trocar a fralda das fraquezas.
Os fracos não ficam por muito tempo por aqui não, e se chorar demais, já era.
Viver em outro país não é fácil, mas vale a pena. e talvez alguém pergunte: " mas o que o que vale a pena passar por tanto sufoco?" O único prazer é você chegar onde quis e conseguir o que buscou. Cada um vai pra outro país com os mais diferentes objetivos, sejam eles buscar uma vida melhor, um salário melhor, construir uma família americana, fazer sua pós na Harvard, é ser fluente no inglês, é viver a vida americana, é lembrar todos os dias que cruzou a fronteira, que passou pela imigração em Los Angeles, e que ouviu o cônsul na embaixada americana dizer: "parabéns, seu visto foi aprovado", e quando aterrizar nos Estados Unidos, ouvir o cara da imigração, "seja bem-vinda aos Estados Unidos".
Ahhhh, isso é bom!!
É, tô realizando meus sonhos longe de casa, mas acima de tudo isso eu tô conhecendo um pouco mais do mundo, tô fazendo novos amigos, conhecendo muitos lugares, tô aprendendo uma nova língua, casei com o homem dos meus sonhos, e agora posso dizer que a visão não tá mais tão embaçada e novamente me sinto em minha zona de conforto. Quando tô em algum lugar, posso finalmente e novamente dizer: tenho que ir agora, tenho que ir pra casa!
Muita gente sente vontade de também buscar seus sonhos ao longe, mas ainda tem medo de sair do ninho, até que o cansaço do que ela tem agora vira desapego, e alguma coisa acontece e ela acorda mais louca, mais decidida, mais corajosa. Aí não tem jeito! Ela só vai!
Só digo uma coisa, viver aqui não é pros fracos, então se vim, não olhe pra trás, não desista, porque o caminho da volta será muito mais doloroso do que o da vinda quando você deixa seu o coração aqui.
